35 cores do crepúsculo. 35 cantos da água. 35 perfumes da terra. 35 m2 do apartamento em que vivo, na cidade de São Paulo, com o barulho do trânsito e essa mania de quantificação. Essa capacidade de me desnudar no verso e de me vestir na vida. Certo gosto pela solidão. Indivíduo parido e partido pelo tempo burguês: às vezes querendo marcar de alguma forma minha passagem pelo mundo, entre 1978 e algum ponto ainda indefinido do século XXI; às vezes desejando desaparecer numa mata fechada, escapando das estatísticas e dos cemitérios. Esse espanto de me imaginar enterrado num cemitério do litoral: entre a umidade, as cruzes, os urubus, o barulho do mar e o esquecimento (os ossos dos mortos duram mais que os cemitérios). Esse escrever poesia e essa dificuldade para a prosa de quem escreve no escritório: como se vomitasse palavras, como se manquitolasse, como quem agoniza, para não enlouquecer. Quanta saudade dos irmãos que, por delicadeza, preferiram morrer. Essa certeza de que Drummond é o poeta maior e essa desconfiança de que a vida não é mais uma ordem. Aos 35 anos os músculos do homem começam a atrofiar. Homem húmus terra nem sempre fértil. 7,5 bilhões de seres humanos no mundo, nem todos comem todos os dias. Quanta vontade de explodir o mundo burguês, que joga comida, homens, mulheres e crianças no lixo. Essa individualização – esse eucentrismo – que separa os homens. Esse escritório que me empurra para a poesia: essa clandestina. Essa moral cristã que prega na cruz e afasta da terra. Essa moral cristã que separa o desejo do amor. Esse pronome demonstrativo: inescapável herança do poeta de Itabira? Enfim. Eu: 35 anos: paulistano canalizado como os rios da cidade, como o Água Preta, que corta meu bairro por baixo do concreto: carregando fezes, dores e saudades.

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