BARTLEBY: INSEGURANÇA, ADOECIMENTO E MORTE DE UM TRABALHADOR

Prelúdio

Bartleby, o escrevente, é um conto publicado por Herman Melville em 1853. Oitenta páginas na edição de bolso. Mas, se o texto é curto, as interpretações são infinitas e possíveis, o que demonstra a força do conto. Bartleby seria "o novo Cristo ou o irmão de todos nós"1. Bartleby é "a figura extrema do nada de onde procede toda a criação e, ao mesmo tempo, a mais implacável reivindicação deste nada como pura, absoluta potencia.”2 Bartleby seria um precursor do movimento Occupy Wall Street3. Bartleby seria um anúncio do colapso da escrita do próprio Melville, que parou de escrever pouco tempo depois. Bartleby é um agente do caos, um destruidor da representação4. Bartleby simboliza uma doença, uma enfermidade, um mal endêmico das literaturas contemporâneas: a pulsão negativa, ou atração pelo nada, que paralisa as melhores mentes, que conduz não poucos escritores a dizerem um sonoro não para a escrita5.

Vale a pena dedicar algumas palavras ao último citado. No romance Bartleby e companhia, Vila-Matas cataloga e discute casos de escritores – reais e inventados – acometidos pela pulsão negativa, ou atração pelo nada, ou síndrome de Bartleby. E se o livro pode ser chamado de romance, talvez seja justamente pelos escritores inventados e pelos acontecimentos duvidosos atribuídos a escritores reais. Exemplo: "Melville teve a síndrome antes que seu personagem existisse, o que nos poderia levar a pensar que talvez tenha criado Bartleby para descrever sua própria síndrome." É sabido que Melville parou de escrever depois e não antes de Bartleby, o que sugere que a tese de Vila-Matas é uma invenção (um acontecimentos duvidoso atribuído a um escritor real), mas pouco importa, porque o objetivo era, provavelmente, inventar (qualquer leitor minimamente capacitado percebe que o texto é todo jogo e brincadeira). Seja como for, neste ponto Deleuze está mais próximo dos fatos: "Bartleby anuncia o longo silêncio no qual penetrará Melville, rompido apenas pela música dos poemas e de onde só sairá para Billy Budd." Vila-Matas não chegou a causar o bloqueio da minha escrita minguada, mas prejudicou minha interpretação, por muito tempo associei Bartleby ao não escrever. Como estou convencido de que é mais do que isso, resolvi inscrever minha interpretação entre as muitas disponíveis.

No escritório de um poeta-advogado, no centro de São Paulo, no final do século XX, havia centenas de enciclopédias, livros de capa dura que cobriam as paredes, acumulavam pó, absorviam a luz e sufocavam. Quando perguntávamos para que serviam aqueles livros, o poeta-advogado respondia que “não serviam para absolutamente nada!” É o mundo de Bartleby: escritório, pó, asfixia, pouca luz, repetição, ausência absoluta de propósitos.

Quando penso em Bartleby, vejo-o no escritório, diante de uma janela que dá para uma parede escurecida pelo tempo e pela sombra. A falta de luz e de visão sufoca. As janelas se abrem para paredes, não há esperança, só abandono. Tudo se passa em ambiente fechado: um escritório sem luz natural, sem ventilação e sem saída. A visão é bloqueada por todos os lados, como a vida dos homens, que apesar de tudo e sem porquê: existem.

O advogado-patrão-narrador do conto Bartleby afirma que "a felicidade flerta com a luz"6; se é assim e se o contrário é verdadeiro, é possível afirmar, com Camus, que "os homens morrem e não são felizes"7, o escrevente entre eles. Aliás, houve quem comparasse Bartleby a Camus, aquele seria um precursor deste, um homem revoltado contra o absurdo8.

Um dia o advogado-patrão-narrador é promovido a oficial e a carga de trabalho cresce no escritório, é quando Bartleby é contratado e entra na história: "palidamente limpo, tristemente respeitável, incuravelmente pobre!"9. A partir daquela manhã de verão o escrevente passa a habitar o conjunto de salas no segundo andar do n°... da Wall Street, mais precisamente atrás do biombo, sempre atrás do biombo, o que é tão sintomático como pouco comentado. Por que Bartleby se refugiava atrás do biombo? Ele chega a dizer "I would prefer to be left alone here" (Eu preferiria que me deixassem sozinho aqui, sendo que este "aqui" era atrás do biombo, é uma das poucas falas afirmativas do escrevente).

A equipe de "colaboradores" (para usar o jargão dos departamentos de RH) era formada por outros dois escreventes e um mensageiro: Turkey, Nippers e Ginger Nut (respectivamente: Peru, Alicate e Biscoito de Gengibre). Todos comandados pelo advogado-patrão-narrador. Turkey: mais de sessenta anos, ficava vermelho e tinha sua capacidade de trabalho seriamente comprometida depois do meio-dia, à tarde copiava com fúria e intensidade, fazia barulho, esmurrava os papéis e, sobretudo, produzia borrões. Nippers: mais ou menos vinte e cinco anos, pele amarelada, ambicioso, sofria de má digestão, rangia os dentes, ficava irritado e tinha sua capacidade de trabalho seriamente comprometida de manhã. Como as crises dos escreventes ocorriam em turnos alternados, o advogado conseguia tocar os trabalhos, no começo chegou a pensar que a contratação de Bartleby compensaria as oscilações dos outros dois copistas. O último a compor o ecossistema do escritório é Ginger Nuts: aproximadamente doze anos, órfão de pai, entregava mensagens, limpava e varria o escritório, comprava biscoitos de gengibre para os demais, daí o apelido.

Nas grandes obras toda palavra e toda sentença são gravemente calculadas, nada é à toa, as palavras e as sentenças entram apenas quando é absolutamente impossível ficarem fora. É o que se percebe em Bartleby à medida que a leitura pede releituras, conforme passamos pelos comentadores, quando saltamos de uma tradução para outra e até para o texto original, em inglês. Sim, é preferível cotejar o original, porque toda tradução tem um quê de traição, e a mania de evitar as repetições pode ser fatal no conto de Melville. Especialmente quando decidem evitar a repetição da sentença (I would prefer not to/Eu preferiria não), que Bartleby repete catorze vezes; uma variante da sentença (I prefer not/Eu prefiro não) é pronunciada três vezes pelo escrevente. É assim que está no texto original, mas as traduções variam. Quando o patrão-narrador insiste, o escrevente troca o futuro do pretérito (preferiria) pelo presente do indicativo (prefiro). É o que vai aparecer mais à frente, em As recusas, onde respeitei as sentenças pronunciadas no original, mantendo as repetições que, desconfio, são importantes para entender o caso Bartleby. Não acredito que Melville tenha criado o escrevente primeiro na cabeça para depois colocá-lo no papel, mais provável que conteúdo e forma tenham se forjado dialeticamente, porque são inseparáveis, daí a importância de manter as repetições que as traduções tentam evitar, daí a importância de contextualizar as recusas do funcionário.

Contar a história não prejudica quem ainda não leu porque o fundamental não está escrito, está no que não é contado. Resumidamente. Com o crescimento da carga de trabalho o advogado-patrão-narrador resolve contratar um terceiro escrevente, um rapaz jovem e pouco descrito. Sabemos apenas que era frágil e pálido, que tinha olhos cinza e rosto enxuto. É Bartleby. A partir do terceiro dia o escrevente se recusa a executar tarefas, começa se recusando examinar cópias, termina na cadeia, recusando comida: morre ao pé do muro, com os olhos abertos e sem brilho.

Diversas interpretações sobre o conto podem ser encontradas. Como escrevi, são todas possíveis, afirmar, como faço, que o caso Bartleby tem a ver com um adoecimento relacionado ao trabalho é só mais uma interpretação possível. Não se trata de definir exatamente o que houve com o escrevente, seria confundir ficção com realidade, mais interessante é apontar como a relação entre trabalho e adoecimento é pouco notada pelos comentadores do texto, apesar dos fatos acontecerem dentro de um escritório e de envolverem um patrão e um empregado.  

As recusas

1º) Nos três primeiros dias Bartleby produziu "quantidades extraordinárias de cópias", ainda que escrevesse em "silêncio, apático, mecânico." O narrador-patrão parece querer que o escrevente se alegrasse com o enfadonho trabalho de copista... No terceiro dia o narrador-patrão pede que o funcionário o ajude a revisar documentos, é quando aparece pela primeira vez a voz e a sentença de Bartleby: "Eu preferiria não".

2º) "Alguns dias depois", não sabemos ao certo quantos, o advogado-patrão volta a solicitar que Bartleby ajude a revisar cópias, recebe a resposta padrão: "Eu preferiria não". Mas insiste explicando que revisar cópias é parte do trabalho dos escreventes, é quando "Eu preferiria não" se torna "Eu prefiro não" pela primeira vez. O presente do indicativo substituiu o futuro do pretérito, a decisão deixa de ser condicional para se tornar "irreversível". A mudança no tempo verbal ocorre justamente quando estavam em questão os limites do trabalho do escrevente, é um indício de que naquele momento o patrão rompeu o acordo que havia firmado com o funcionário, tentando forçá-lo a executar uma tarefa para a qual não seria remunerado.

3º) "Passaram-se mais alguns dias, com o escrevente dedicado a outra tarefa de fôlego", novamente o narrador deixa de informar quantos dias, a situação se repete, o escrevente está concluindo cópias, o patrão informa que pretende conferir os documentos em conjunto, a resposta: "Eu preferiria não". Na sequência o narrador-patrão procura Bartleby pedindo-lhe que fosse ao correio ("uma caminhada de três minutos"), a resposta: "Eu preferiria não". O patrão insiste, o funcionário retruca com "Eu prefiro não". Depois o narrador pede que Bartleby vá à outra sala chamar Nippers, a resposta é "Eu prefiro não". Com a insistência do patrão, o presente do indicativo (prefiro) substitui o futuro do pretérito (preferiria).

4º) "Os dias se passavam" até que, "num domingo de manhã", o patrão resolve ir a igreja ouvir um renomado pregador, como chega muito cedo, resolve passar no escritório e é surpreendido por Bartleby, constata que o escrevente estava vivendo ali, ainda que "sem prato, espelho ou cama." Hilário: Bartleby diz que sentia muito, mas estava atarefado e preferia que o advogado não entrasse, atordoado, ele se retira e perde a missa. O narrador-patrão-advogado lamenta a condição do funcionário: "Que miserável solidão se revela aqui! Sua pobreza é imensa: mas esse isolamento, esse desamparo... que horror!" Ainda ele: "Aos domingos, Wall Street é tão deserta quanto Petra; e todas as noites de todos os dias é um só vazio."

5º) Segunda-feira de manhã, o patrão estava decido a conversar com Bartleby, caso este preferisse não responder, seria demitido, não sem receber um pouco a mais do que fazia jus. O advogado chama o escrevente uma vez, mas fica sem resposta, daí esclarece que não faria nenhum pedido, queria apenas conversar. Bartleby aparece. O narrador-patrão pergunta onde o escrevente havia nascido, resposta padrão: "Eu preferiria não". Então ele pede que o escrevente fale de si próprio, resposta padrão: "Eu preferiria não". Insiste: "Qual a sua resposta, Bartleby?" O escrevente retruca: "No momento prefiro não dar resposta". A insistência faz o "Eu preferiria não" (I would prefer not to) se tornar novamente "Eu prefiro não" (I prefer not). Na sequência ocorre uma recusa-chave, que não é percebida pelos filósofos (Deleuze e Agamben) nem pelos comentaristas em geral, o advogado se dirige "amigavelmente" ao funcionário e diz: "Bartleby, esqueça tudo aquilo sobre revelar-me sua história, mas deixe-me pedir-lhe, como amigo, que respeite integralmente as regras deste escritório. Prometa-me que amanhã e depois de amanhã você será meu auxiliar no exame dos documentos; prometa-me, em suma, que nos próximos dois dias você será minimamente razoável prometa-me, Bartleby". A resposta: "No momento preferiria não ser minimamente razoável". O escrevente atordoa o patrão e os comentaristas, mas uma releitura atenta mostra que estava em disputa a revisão (exame) dos documentos, era o que um exigia e o outro recusava.

6º) Ainda segunda-feira de manhã. Estamos no ponto-chave do conto. Aquele "no momento" (at present) dito por Bartleby é revelador, por que naquele momento ele preferiria não ser minimamente razoável? Em outra oportunidade ele seria razoável? Não ser razoável teria a ver com a exigência de revisar documentos? Nippers se aproxima irritado (sofria de má digestão pela manhã). Turkey se aproxima calmo (ficava vermelho somente à tarde) e se dirige ao advogado: "Com sua permissão, senhor, ontem pensava em Bartleby, e pensei que, se ele talvez preferisse beber um quarto de cerveja da boa todo dia, que isso o ajudaria a se sentir melhor e, tenho certeza, o tornaria apto a auxiliá-lo com o exame da documentação." Era a última chance: a última saída antes do pedágio. É significativo que o convite tenha partido do funcionário mais experiente, que discretamente se oferece para ajudar e evitar o pior. O que teria acontecido se Bartleby passasse a "beber um quarto de cerveja da boa todo dia"? Ele se enturmaria com os outros funcionários? Criaria vínculos? Agiria coletivamente? É desnecessário especular o que aconteceria se Bartleby tivesse aceitado o convite de Turkey, porque seria outra história, provavelmente desinteressante. O essencial é que Turkey associa a cerveja à revisão (exame) de documentos. Ao reproduzir a fala de Turkey, o narrador revela que a questão-chave era Bartleby se recusar a revisar documentos. Como escrevente recebia por produção, quatro centavos por página (de cem palavras), é absolutamente razoável se recusar a conferir cópias, especialmente de terceiros. O narrador-patrão não comenta o acordo feito com o escrevente ao contratá-lo. É estranho um advogado não citar contratos, caputs, artigos, alíneas... Bartleby fecha a questão e as portas: "Eu preferiria que me deixassem sozinho aqui".

7º) Terça-feira. Ocorre a virada decisiva. Bartleby está de pé, de frente para uma janela que dá para uma parede. O advogado indaga por que ele não está copiando, Bartleby responde que havia decidido parar de escrever. O advogado pergunta: "qual é a razão?" Bartleby retruca: "Você não é capaz de ver a razão?" Se o patrão-narrador não vê ou não quer ver a razão é difícil de cravar, mas ele deixa pistas. Deleuze: "Pode-se supor que a contratação de Bartleby foi uma espécie de pacto, como se o advogado, depois de sua promoção, tivesse decidido converter esse personagem, sem referências objetivas, num homem de confiança que lhe deveria tudo. Quer fazer dele o seu homem. O pacto consiste no seguinte: Bartleby copiará, próximo de seu chefe, a quem ouvirá, mas não será visto, tal como um pássaro noturno que não suporta ser olhado. Então, não há dúvida, no momento em que o advogado pretende (sem querer fazê-lo de propósito) tirar Bartleby de seu biombo para cotejar as cópias com os outros, quebra o pacto. Por isso Bartleby, ao mesmo tempo que 'prefere não' cotejar, já não pode continuar copiando." Mas Deleuze não segue a pista, prefere analisar a “fórmula” (I would prefer not to), e escorrega; preferir não cotejar e deixar de copiar não acontecem ao mesmo tempo; é a quebra do “pacto”, e não a “fórmula”, que faz Bartleby parar de copiar. O conto não traz informações sobre o contrato de trabalho firmado entre o advogado e o escrevente, mas é plausível supor que o acordo se limitasse a copiar, não incluindo ir ao correio, chamar os outros escreventes, falar da própria vida e, sobretudo, revisar documentos. É somente após a recusa de Bartleby que o narrador-patrão menciona que conferir cópias fazia parte do trabalho do escrevente. Teria esclarecido esse ponto quando da contratação? Se houve falha de comunicação ou se o advogado deliberadamente ludibriava os funcionários é difícil de saber, a culpa que ele expressa aponta para a segunda opção, mas é impossível cravar, o fato é que o advogado pagava por página copiada, o trabalho de conferência não seria pago para Bartleby. Por se fixar na análise da “fórmula” (I would prefer not to), Deleuze deixa escapar o “pacto” e as formas de pagamento. Agamben vai mais longe, vê em Bartleby uma "implacável reivindicação do nada", mas não comenta o trabalho do copista e passa batido pela forma de remuneração: há mais coisas num escritório do que pode imaginar nossa vã filosofia.

8º) "Alguns dias se passaram." O patrão reflete e informa que o escrevente deveria deixar o escritório em seis dias, o primeiro ajudaria o segundo assim que este tomasse a iniciativa. O prazo termina, mas Bartleby permanece atrás do biombo. O narrador-advogado vai até o escrevente e diz: "É chegada a hora; você precisa deixar este lugar; sinto muito; tome aqui algum dinheiro; mas você precisa partir." Bartleby responde: "Eu preferiria não." Patrão: "Você deve." Deixa trinta e dois dólares para o escrevente e sai, mas antes esclarece que lhe devia apenas doze dólares, e que a diferença podia ficar para o funcionário.

9º) No dia seguinte pela manhã, o advogado chega ao escritório e percebe que o escrevente continuava por lá, involuntariamente bate na porta e Bartleby responde: "Ainda não; estou ocupado." Quando entra no escritório o narrador-patrão constata que o funcionário além de continuar por lá, não havia pegado o dinheiro, ele procura Bartleby e lhe dirige a palavra com energia: "Você vai ou não vai embora." Resposta padrão: "Eu preferiria não ir." O escrevente já não copiava, era como uma peça do mobiliário, tinha longos devaneios diante da janela que dava para uma parede.

10º) "Passaram-se alguns dias", o narrador-patrão lê tratados teológicos, chega a pensar que sua missão no mundo era manter o escritório para que o escrevente pudesse permanecer pelo tempo que fosse necessário. Mas a presença de Bartleby começa a gerar fofocas, prejudicando os negócios, ocorre ao advogado que o escrevente pudesse ser longevo, e pior, que poderia reclamar a posse do escritório. O narrador-patrão "sugere" que o escrevente se retire definitivamente, mas depois de três dias recebe a resposta, Bartleby preferia não se retirar. A solução é drástica, o patrão muda o endereço do escritório e deixa o escrevente para trás.

11º) O advogado-narrador mantém a porta do novo escritório fechada por dois dias, com medo de que o escrevente pudesse aparecer. Mas só depois de aproximadamente duas semanas que chegam notícias de Bartleby. Várias pessoas procuram o narrador, inclusive o locatário do antigo escritório, pedem ajuda para retirar o escrevente do prédio: expulso do escritório, passava os dias sentado no corrimão e as noites dormindo na entrada do imóvel. O narrador pensa em não ajudar, mas teme ver seu nome exposto nos jornais. Resolve procurar Bartleby, desde que pudesse conversar com ele de forma reservada. O advogado informa ao escrevente que, se este não fizesse alguma coisa, alguma coisa seria feita contra ele. Recebe a resposta padrão: "Eu preferiria não". Pergunta se o ex-funcionário gostaria de exercer algum outro ofício: vendedor, atendente, viajar pelo país fazendo cobranças? Resposta: "Eu preferiria não". Tentativa absurda: "E ir para a Europa como acompanhante e entreter algum jovem cavalheiro com suas palavras, será que isso não serve?" Bartleby entretendo alguém com sua conversa... Resposta: "De maneira nenhuma. Não me agrada. Não há nada certo e definido nisso. Gosto de ficar parado. Mas não sou exigente." Última tentativa, indagado se aceitaria dividir o mesmo teto que o advogado (lar e não escritório), pelo menos até acharem uma solução, Bartleby responde: "Não, no momento eu preferiria não fazer qualquer mudança."

12º) "Alguns dias" se passam. O narrador recebe uma mensagem informando que o locatário havia denunciado Bartleby, que estava preso. O patrão procura seu ex-funcionário na cadeia, ao chamá-lo, ouve: "Não quero lhe dizer nada." Antes de deixar a prisão, o advogado aceita pagar propina, dá dinheiro ao cozinheiro (cara-da-boia) para que este prepare comida diferenciada para o preso. Quando o jantar é oferecido a Bartleby, a resposta é dura e direta, prescinde da condicional: "Prefiro não jantar hoje" (I prefer not dine today). Alguns dias depois o narrador-patrão volta a visitar Bartleby e o encontra morto ao pé do muro, tinha os olhos abertos, mas sem brilho.

Há mais coisas num escritório do que pode imaginar nossa vã filosofia

Confesso que tive vontade de chamar este tópico de Miséria da filosofia. Seria uma homenagem a Marx e um deboche com os filósofos. Mas seria também arrogante, pretensioso e falso. A questão não é esboçar uma interpretação para excluir as demais, trata-se de chamar a atenção para alguns detalhes do texto e para a relação entre trabalho e adoecimento. Então preferi evitar, optei pela elegância britânica. A propósito e considerando que Melville e Marx foram contemporâneos, exercício interessante, e por fazer, é pesquisar se um leu o outro. Bartleby pode ser pensado a partir da categoria estranhamento (entfremdung), que estava sendo trabalhada um pouco antes da criação do escrevente.

Mas voltemos aos filósofos, mais precisamente Deleuze e Agamben. O primeiro discute "a fórmula" de Bartleby (I would prefer not to). O segundo usa Bartleby para discutir a "ambuiguidade da potência (que é sempre potência de fazer e de não fazer)".

Para Deleuze, a fórmula (I would prefer not to/Eu preferiria não) do escrevente "aniquila 'copiar', a única referência em relação à qual algo poderia ou não ser preferido".  Mais Deleuze: a fórmula "exclui qualquer alternativa e engole o que pretende conservar assim como descarta qualquer outra coisa; implica que Bartleby para de copiar, isto é, de reproduzir palavras; cava uma zona de indeterminação que faz com que as palavras já não se distingam, produz o vazio da linguagem." Só que o filósofo não explica por que Bartleby continua copiando, por que só muito depois da fórmula ele decide parar de copiar? Ainda Deleuze: "O próprio Bartleby só tinha como saída calar-se e retirar-se para trás de seu biombo cada vez que pronunciava a fórmula, até seu silêncio final na prisão. Depois da fórmula não há mais nada a dizer." A questão central, segundo o filósofo, é que a fórmula do escrevente "desarticula os atos de fala" do próprio e dos demais, aumentando a indeterminação da linguagem: "I prefer not to é também um traço de expressão que contamina tudo, fugindo à forma linguística, destituindo o pai da sua palavra exemplar, tanto quanto o filho de sua possibilidade de reproduzir ou de copiar." Mas por que o escrevente formulou a fórmula? É Deleuze quem responde: "tão logo o advogado pretende fazê-lo abandonar seu biombo, Bartleby emite sua fórmula." Mas então ele tinha preferências, preferia se refugiar atrás do biombo. Até o terceiro dia o escrevente havia produzido uma quantidade extraordinária de cópias: "Não conhecia pausa para digestão. Copiava dia e noite, fosse ao sol ou à luz de velas." É quando o advogado pede-lhe que examine uns poucos papéis e ouve como resposta: "I would prefer not to/Eu preferiria não." São as primeiras palavras e é a primeira negativa do escrevente. Ou seja, Bartleby estava copiando e é interrompido, o advogado manda que ele pare para ajudar a revisar documentos. Colocada neste contexto, a fórmula (I would prefer not to/Eu preferiria não) indica que Bartleby preferiria continuar copiando, se não porque gostasse da tarefa (o que é difícil de imaginar), pelo menos por outras razões que precisam ser elucidadas. Neste ponto Deleuze escorrega, para o filósofo, o escrevente "precisava recusar um (examinar documentos) para tornar o outro impossível (copiar documento)". É uma meia verdade. Bartleby precisava se recusar a revisar documentos para poder copiar documentos, daí a fórmula (I would prefer not to/Eu preferiria não). Se dissesse "preferiria não revisar" ou "preferiria apenas copiar" não haveria mistério. Há um fato, uma miudeza de escritório, que passou batido dos filósofos e demais analistas (as tais coisas que a vã filosofia deixa escapar): Bartleby produzia cópias por quatro centavos a página (com cem palavras). Trabalhadores que ganham por produção, como os cortadores de cana, costumam deixar de ir ao banheiro e até morrem trabalhando. Ora, se o escrevente ganhava por produção (cópia produzida), havia uma forte razão para ele preferir não revisar documentos, nem ir ao correio, nem chamar outro copista na sala vizinha, nem perder tempo respondendo às perguntas do chefe (Onde nasceu? Pode me contar alguma coisa?). Na minha enumeração, é só depois da sexta negativa (I would prefer not to/Eu preferiria não) que o escrevente decide parar de copiar, justamente depois de ser interrompido para conferir documentos, ir ao correio, chamar outro copista na sala vizinha e responder perguntas do chefe. É como se Bartleby suportasse o trabalho repetitivo e braçal, mas não suportasse parar para atender aos pedidos do chefe: ou porque significavam reduções salariais, ou porque aquelas pausas o retiravam de trás do biombo, ou as duas coisas ao mesmo tempo. Deleuze percebe esta possibilidade, como se houvesse um "pacto" estabelecido entre o patrão e o escrevente: "no momento em que o advogado pretende (sem querer fazê-lo de propósito) tirar Bartleby de seu biombo para cotejar as cópias com os outros, quebra o pacto." Mas o filósofo se concentra na "fórmula" e não desenvolve o raciocínio sobre o "pacto", por isso não percebe que Bartleby era remunerado por produção de cópias (quatro centavos a página com cem palavras). Mas, registre-se, a ideia deleuzeana de que a “fórmula” de Bartleby "exclui qualquer alternativa e contamina tudo" teve exatamente o efeito que descreve, contaminou tudo e excluiu qualquer alternativa: da filosofia à psicanálise passando pela crítica literária, não há quem discuta o conto de Melville sem reproduzir a ideia de Deleuze. Curioso notar que, por mais excêntrica e poética que seja a "fórmula" de Bartleby, as capacidades de trabalho do mensageiro e dos outros escreventes não foram nem "aniquiladas" nem "excluídas". Apesar de incorporarem o verbo preferir nas falas cotidianas, nenhum dos personagens disse "eu preferiria não" ao trabalho, muito mais longe estiveram de dizer "nós preferiríamos não", na primeira pessoa do plural, é o limite da ideia deleuzeana e da "fórmula" do escrevente.

Para Agamben, Bartleby pertence à "constelação literária" dos escreventes (Akaki Akakievitch, os kafkianos anônimos, Bouvard e Pécuchet), mas também pertence a uma "constelação filosófica", e, talvez, "apenas esta contenha a cifra da figura que a outra se limita a traçar." O filósofo vai de Aristóteles a Nietzsche em busca da "cifra" de Bartleby, discute vontade e potência a partir da “fórmula” (I would prefer not to/Eu preferiria não) do escrevente. Segundo Agamben, a “fórmula” de Bartleby "abre uma zona de indiscernibilidade entre o sim e o não, o preferível e o não preferido. Mas também [...] entre a potência de ser (ou de fazer) e a potência de não ser (ou de não fazer)." Mais Agamben: "A infinita repetição daquilo que aconteceu abandona totalmente a potência de não ser. No seu obstinado copiar, como no contingente de Aristóteles, 'nada existe de potente não ser'. A vontade de potência é, na verdade, vontade de vontade, ato eternamente repetido, e só deste modo potenciado. Por isto o escrivão deve deixar de copiar, renunciar à cópia." Ainda Agamben: "Bartleby não consente, nem sequer simplesmente recusa, e nada lhe é mais estranho do que o páthos heróico da negação." Para fazer filosofia a partir do conto de Melville, Agamben precisa ignorar as miudezas de escritório, e do próprio texto. Esquece que o escrevente produziu "quantidades extraordinárias de cópias" nas primeiras semanas. Ignora que o escrevente prefere não revisar os documentos que produz, provavelmente porque ganha por cópia produzida e não por cópia revisada. Agamben passa batido também pela ideia deleuzeana de rompimento do “pacto”, apesar de ter lido o texto do francês. O filósofo italiano prefere discutir vontade e potência a partir da “fórmula” (I would prefer not to/Eu preferiria não). Para Agamben, a infinita repetição do copiar aparece como abandono da potência de não ser, e não como consequência do pagamento por produção (quatro centavos a página com cem palavras). Isso quando já se sabia que o pagamento por produção mata muitos Bartlebies no mundo real.

Ao constatar que era impossível obrigar Bartleby a executar tarefas, especialmente revisar documentos, o advogado-patrão toma uma atitude drástica: muda de escritório deixando o escrevente para trás (como o capital muda de país quando suas exigências não são atendidas). Ali ocorreu uma concordância que depõe contra Deleuze e Agamben. Durante a mudança o advogado ordenou que o escrevente ficasse atrás do biombo. Bartleby obedece, e é como se dissesse que preferiria ficar ali. Algumas ordens ele cumpria (passou os primeiros dias copiando sem parar). Então há algo que podia ser preferido e conservado, não há uma zona de indeterminação que faz com que as palavras não se distingam (Deleuze). Então não há uma zona de indiscernibilidade entre o sim e o não (Agamben).

Remuneração por produção + captura da subjetividade = doença do trabalho

Não é Bartleby que se retira para trás do biombo, são as solicitações do chefe que retiram Bartleby de trás do biombo: este é o limite, a possibilidade e a desgraça do escrevente. Pode ser chocante para os filósofos consagrados (acostumados com as universidades, as conferências e as entrevistas); mas não espanta quem conhece a realidade dos escritórios (os despachos, os contratos e os escaninhos): Bartleby poderia passar a vida copiando calado, atrás do biombo; poderia morrer copiando, inauguraria o que ficou conhecido como Karoshi (morte por excesso de trabalho). O "pacto" firmado Bartleby talvez lhe permitisse viajar para longe dali nos pensamentos, é essa subjetividade que as solicitações do chefe ameaçavam capturar, e talvez por isso a obstinada resistência do escrevente. Revisar cópias em voz alta violaria sua subjetividade. Um homem pode executar uma tarefa mecânica, como copiar contratos, "pensando numa mulher ou num time"10, ou imaginando versos; não conseguirá fazer o mesmo revisando documentos coletivamente. É uma possibilidade para explicar por que o escrevente se refugiava atrás do biombo, seus problemas começavam sempre que lhe tiravam de lá. Há uma indicação do patrão-narrador que vai nessa linha, diz ele que não conseguiria imaginar o poeta Byron revisando documentos legais. Também este é um caminho interpretativo que escapou dos filósofos e demais analistas: e se Bartleby fosse poeta, e se imaginava poemas enquanto trabalhava, e se escolhia palavras entre as que copiava? Pelo menos um verso ele deixou: "I would prefer not to/Eu preferiria não". 

É a ruptura do acordado entre Bartleby e o patrão que faz o escrevente recusar tarefas e, na sequência, se recusar inclusive a copiar. Como o advogado-narrador praticamente não detalha o acordo de contratação (o que é estranho para um homem da lei), surge a ambiguidade que permite infinitas interpretações. Sabe-se, apenas, que o escrevente recebia por cópia produzida (quatro centavos por página com cem palavras). Nunca saberemos se o acordado seria pagar apenas após a revisão das cópias produzidas, porque somente a versão do patrão é conhecida, mas, se fosse assim, o trabalho não pago seria ainda maior. Para o patrão, revisar as cópias produzidas fazia parte do trabalho do escrevente, as recusas deste eram vistas por aquele como "privilégios e concessões". Nunca saberemos qual é a versão de Bartleby. O advogado jamais perguntou se o escrevente preferiria apenas copiar, sem revisar as cópias. Por mais indulgente que tenha sido, o patrão jamais cogitou tolerar que Bartleby se recusasse a revisar os documentos que o próprio ou dos demais produziam. É a fórmula (I would prefer not to) que narrador-patrão não pronuncia, mas emprega: Eu preferiria não pagar pela revisão das cópias. "Apenas como personificação do capital, o capitalista é respeitável. Como tal, ele partilha com o entesourador o instinto absoluto do enriquecimento."11 Interessante notar que o advogado não contesta as primeiras recusas do escrevente porque estava muito atarefado, ou seja, estava submetido ao tal "instinto absoluto de enriquecimento". Perto do fim, quando Bartleby está prestes a ser preso, o patrão se propõe a levar o escrevente para casa, mas não cogita levá-lo para o novo escritório. Age exatamente como uma personificação do capital. Poderiam as recusas de Bartleby paralisar os demais trabalhadores e, consequentemente, os lucros? A "fórmula" do escrevente produzir um "vazio da linguagem" seria tolerável. A "fórmula" do escrevente inviabilizar o processo de trabalho seria intolerável. É o que explica por que o patrão convidou o escrevente para dividir o teto do seu próprio lar, mas não do seu novo escritório.

Há uma questão laboral que é chave para compreender o caso Bartleby. A ruptura do acordado fulminou o sistema imunológico que protegia o escrevente do trabalho. Mas, como a história é contada na perspectiva do patrão, as informações são camufladas ou até omitidas, produzindo ambuiguidade e infinitas interpretações. Restam apenas indícios. Nippers sofria com questões ergonômicas e de má digestão, tinha sua capacidade de trabalho seriamente reduzida de manhã. Turkey sofrida de uma vermelhidão indeterminada que lhe prejudicava a capacidade de trabalho à tarde. Seriam males relacionados ao trabalho? Bartleby foi contratado com a expectativa de estabilizar as oscilações de Nippers e Turkey, mas teve sua capacidade de trabalho completamente liquidada (de manhã e à tarde). Esperava-se que Bartleby herdasse as capacidades laborais dos outros escreventes (Turkey pela manhã e Nippers à tarde); mas ocorreu o inesperado, ele herdou a incapacidade laboral dos outros (Nippers pela manhã e Turkey à tarde). Bartleby é a síntese, pela negativa, de Turkey e Nippers, uma possibilidade que estava presente nas incapacidades de ambos. 

Sabe-se, apenas, que Bartleby ganhava por produção: quatro centavos por página com cem palavras. Não sabemos qual era a forma de pagamento dos outros escreventes, mas há um indício pouco notado. Ginger Nuts não era escrevente, apenas entregava mensagens e limpava o escritório por um salário semanal de um dólar. Ou seja, ganhava por tempo de trabalho e não por produção, como Bartleby. Para receber um dólar por semana, como Ginger Nuts, Bartleby precisava copiar vinte e cinco páginas (duas mil e quinhentas palavras). Se os outros escreventes recebiam por tempo de trabalho e não por produção de cópias, seria fácil entender por que Bartleby se recusava a revisar documentos produzidos, enquanto os demais não reclamavam: o que para os outros seria um relaxamento, para ele seria uma redução salarial. A influência nefasta da remuneração por produção sobre a saúde dos trabalhadores é conhecida de longa data. É espantoso que esta chave não tenha sido utilizada para analisar o caso Bartleby, mostra que a forma de pagamento está camuflada no conto, que os analistas não costumam revisar os textos que comentam e, sobretudo, que os adoecimentos relacionados ao trabalho são pouco conhecidos.

Os pagamentos por produção causam insegurança aos trabalhadores, que não sabem ao certo quanto receberão; e intensificam o trabalho, provocando acidentes e adoecimentos. Além disso, é comum os patrões se utilizarem de artimanhas para reduzirem os pagamentos. Por exemplo: a cana de açúcar é cortada e medida em metros, mas os pagamentos aos trabalhadores costumam ser realizados com base no peso, possibilitando fraudes e extorsões. O resultado é que os cortadores são forçados a trabalhar cada vez mais, às vezes mais do que suportam. Pagar por cópia produzida e exigir que o escrevente revise os documentos é não remunerar uma parte do trabalho. Sabemos que Bartleby não bebia cerveja e não fazia refeições em restaurantes, ele guardava suas economias na gaveta e se alimentava com bolinhos de gengibre. Estaria juntando dinheiro para publicar um livro, casar, ajudar parentes, voltar para sua terra, trazer a família para a cidade grande? Se sim, não é estranho que o escrevente tentasse produzir cada vez mais (cópias), é o que fazem os cortadores de cana e outros trabalhadores remunerados por produção.

Antes de parar de copiar, Bartleby se recusa, essencialmente, a revisar cópias. Por duas vezes o futuro do pretérito (preferiria) havia avançado para o presente do indicativo (prefiro). As recusas (I prefer not/Eu prefiro não) a ir ao correio e a chamar Nippers na sala ao lado ocorrem depois das recusa a revisar cópias. O tempo que separa a primeira recusa (revisar) da completa paralisação da capacidade de trabalho (copiar) mostra que ocorreu um processo, a capacidade laboral foi se esgotando aos poucos, o que sugere a ocorrência de adoecimento relacionado ao trabalho. Além disso, sabe-se que “o psicótico, em situação de absoluta recusa, pode adotar uma posição irônica, pontuando a inconsistência das referências que lhe são apresentadas, ou pode mesmo se isolar em seu mutismo.”12 Outros indícios: os males de que padeciam os demais escreventes; a sugestão do narrador de que o mal de Bartleby tivesse relação com sua ocupação anterior, estaria tentando se resguardar? 

Seja como for, se pelo texto é impossível estabelecer o nexo causal entre o colapso da capacidade produtiva de Bartleby e o trabalho, no mundo real não é diferente. O capital esconde os adoecimentos relacionados ao trabalho com o mesmo vigor que esconde dinheiro em paraísos fiscais.

 A mulher do sótão

A palavra mulher aparece uma única vez no conto de Melville, talvez por isso passa despercebida. Os homens não têm mães, irmãs, esposas ou amantes. Da mulher do sótão sabe-se apenas que residia no edifício que abrigava o escritório, que ela varria diariamente, esfregava semanalmente e tinha uma cópia da chave. Por que Melville colocou a mulher no conto? Ela ficar com uma cópia da chave é irrelevante, nem os funcionários nem o patrão precisaram daquela cópia. Ela varrer e esfregar são tarefas duplicadas, um possível escorregão de Melville, basta lembrar que o mensageiro, Ginger Nuts, também era responsável por limpar o escritório. Além disso, ela jamais cruza com qualquer um dos personagens, apesar de frequentar o mesmo espaço diariamente. Se é assim, qual a função dela?

A mulher do sótão é uma possibilidade que Bartleby não conseguiu realizar: um ser invisível, sem nome, sem rosto e que dominava a nobre arte de desaparecer, como um bicho do mato. A mulher do sótão se escondia atrás das vassouras. Bartleby não conseguiu se esconder atrás do biombo.

Mas não é só. A mulher do sótão é uma prova que Melville faz o narrador produzir contra si próprio, mas como ela aparece uma única vez, é praticamente invisível, o caso quase não é notado, como a remuneração por produção de Bartleby. O advogado diz sentir um irresistível desalento pela pobreza e pela solidão do escrevente, que morava no escritório: "Aos domingos, Wall Street é tão deserta quanto Petra; e todas as noites de todos os dias é um só vazio. Este edifício também, que nos dias da semana se enche de vida e trabalho, tão logo a noite cai torna-se pura ausência, e durante o domingo resta-lhe apenas o abandono." Por que o narrador não sente a mesma compaixão pela mulher do sótão? Ela também é sua contratada e mora no edifício, além de, provavelmente, habitar um cômodo sem iluminação; e "a felicidade flerta com a luz", segundo ele. Se é assim, ou advogado não se compadece verdadeiramente por Bartleby, ou sua moral é seletiva, porque ele não demonstra nenhuma compaixão pela mulher do sótão.

O narrador suspeito

Narrativas em primeira pessoa, como Bartleby, podem gerar conflitos de interesse, porque quem conta a história tem interesse no desfecho. Ocorre no Grande Sertão: Veredas. O narrador, Riobaldo, tem interesse na história, especialmente em relação a uma das personagens, Diadorim.

Por que o advogado-narrador não esclarece as formas de remuneração dos escreventes Turkey e Nippers? Por que ele não se espanta quando o escrevente ocupa o escritório dia e noite, inclusive copiando "à luz de velas"? Por que ele se espanta apenas quando encontra Bartleby no escritório num domingo de manhã, justamente quando imagina que o escrevente não estivesse copiando? "Havia algo em Bartleby que não permitia supor que pudesse conspurcar a solenidade do dia com alguma ocupação secular." Teria se espantado se encontrasse Bartleby copiando naquele domingo de manhã? Por que o advogado-narrador tem necessidade de contar que o escrevente, anteriormente, havia trabalhado como assistente da Seção de Cartas Extraviadas? Ele mesmo afirmou que não havia necessidade de dar sequência à história. Preferiria associar a morte de Bartleby a problemas adquiridos na ocupação anterior, camuflando o adoecimento ocorrido no seu escritório?

Deleuze também coloca o narrador sob suspeição: "Talvez Bartleby seja o louco, o demente, o psicótico ('uma desordem inata e incurável' da alma). Mas como sabê-lo, se não se levam em conta as anomalias do advogado, que se comporta o tempo todo de modo muito esquisito?" A esquisitice do advogado não tem a ver com loucura, demência ou psicose. A esquisitice dele tem a ver com sua habilidade para contar a história camuflando fatos, ou até omitindo-os, de forma a não se comprometer, evitando produzir provas contra si próprio, afinal, era, sobretudo: "prevenido", além  de ser um homem das leis13.

Bartleby e Emma Bovary

Intimado a dizer em quem se baseou ao criar sua personagem mais famosa, Gustave Flaubert teria respondido "Emma Bovary sou eu". Intimado pela consciência a explicar a morte de Bartleby, o narrador teria escrito o conto? É uma possibilidade, mas não é uma solução, apesar da culpa que o sujeito carregava.

Madame Bovary e Bartleby: os opostos que se completam, os contemporâneos extemporâneos. No romance de Flaubert a exuberância dos detalhes: as coisas, os homens e até as igrejas se curvando à adultera. No conto de Melville os detalhes cuidadosamente escondidos, ou até omitidos: a precária verdade dos escaninhos.  

Ela, uma provinciana, na Normandia. Ele, um escrevente, em Wall Street. Tão longe e tão perto, tão diferentes e tão apaixonantes, tão absurdos e tão humanos. Ambos continuarem absolutamente atuais depõe a favor da literatura e contra o tempo presente. Quantos Bartlebies e quantas Emmas morrerão no mundo real até que os personagens se tornem apenas uma lembrança incômoda? Ah, Emma! “Ah, Bartleby! Ah, humanidade!”

Kafka, Bartleby e Borges

Com a lucidez que só os grandes escritores possuem, Borges14 escreveu que "Kafka projeta sobre Bartleby uma curiosa luz posterior. Bartleby já define um gênero que Franz Kafka reinventaria e aprofundaria a partir de 1919: o das fantasias do comportamento e sentimento ou, como agora lamentavelmente se diz, psicológicas."

É certo que Kafka "projeta uma curiosa luz posterior" sobre Bartleby. Mas a linha de continuidade não é o "gênero das fantasias do comportamento e sentimento", é o trabalho. Com Kafka as profissões são mais importantes do que o nome dos personagens, é o caso, por exemplo: do agrimensor K. e do caixeiro-viajante Gregor Samsa. No conto de Melville ocorre o mesmo, os advogados não tem nome; a mulher do sótão idem, dela sabemos apenas que limpava e varria o escritório; Bartleby não tem nem família, nem amigos, mas sabe-se que anteriormente havia sido empregado na Seção de Cartas Extraviadas. Mas há linhas de descontinuidade, também. Os principais personagens de Kafka são Bartlebies invertidos. Gregor Samsa se preocupa com o trabalho, mesmo tendo sido transformado num inseto. Joseph K. convive com um processo em que não consegue descobrir do que é acusado, sequer lhe ocorre reivindicar o direito ao contraditório e à ampla defesa. O agrimensor K. exige o emprego que lhe havia sido oferecido, acaba perdido num labirinto tão burocrático quanto infinito, mas não desiste e não hesita. Gregor Samsa, Joseph K. e o agrimensor K.:  reações normais em situações absurdas. Bartleby: reação absurda em situação normal. O escrevente se recusa a executar as tarefas que lhe são solicitadas, especialmente revisar documentos. Ser transformado num inseto (Gregor Samsa) é uma situação absurda. Ter parte do trabalho não pago (Bartleby) é uma situação normal na sociedade capitalista. 

Se "Kafka projeta sobre Bartleby uma curiosa luz posterior", como quer Borges, o inverso é verdadeiro, também. Bartleby ainda desperta compaixão, mesmo que hipócrita, o absurdo não estava naturalizado e regulamentado, era possível denunciá-lo, mesmo que involuntariamente. Para os personagens de Kafka já não se coloca o “preferiria não”, todos “prefeririam sim”, não por livre e espontânea vontade, mas porque não há absolutamente nenhuma alternativa. Gregor Samsa, Joseph K. e o agrimensor K são herdeiros de Bartleby. Bartleby é o avô de Gregor Samsa, de Joseph K. e do agrimensor K.  Há muita esperança no mundo, mas não para eles15.

Há um personagem menos famoso de Kafka que, por oposição, dialoga com o escrevente de Melville, é o artista fome, também ele magro, pálido e justo. Trata-se de um jejuador que passava semanas trancado em jaulas, sem nenhum alimento. Só ele e mais ninguém sabia que jejuar era coisa mais fácil do mundo: “no quadragésimo dia eram abertas as portas da jaula coroada de flores, uma plateia entusiasmada enchia o anfiteatro, uma banda militar tocava, dois médicos entravam na jaula para proceder às medições necessárias no artista da fome, os resultados eram anunciados à sala por um megafone e finalmente duas moças, felizes por terem sido as sorteadas, ajudavam o jejuador a sair da jaula, descendo com ele alguns degraus de escada até uma mesinha onde estava servida uma refeição de doente cuidadosamente selecionada. Mas o artista da fome sempre resistia.”16 Preferiria não? As cidades paravam para assistir ao estranho espetáculo, mas o jejuador era triste porque “ninguém conseguia levá-lo a sério”, “se alguma vez uma pessoa bem-intencionada se compadecia dele e queria-lhe explicar que sua tristeza provavelmente vinha da fome, podia acontecer – em especial no estágio avançado do jejum – que respondesse com um acesso de fúria e começasse a sacudir as grades como um animal, para susto de todos.” Com o tempo e a repetição, o espetáculo foi perdendo o brilho. O artista da fome demitiu seu empresário e foi trabalhar num circo “sem se atentar ao contrato” (o "pacto", ou acordo no caso de Bartleby). A jaula do artista da fome foi posicionada perto do estábulo. O jejuador percebeu que o público passava por ali para visitar os animais, e não para apreciar sua arte. Então, radicalizou, ampliou os jejuns, até que afundou na palha que usava para dormir e desapareceu. Um dia o inspetor perguntou aos serventes por que aquela jaula ficava sem uso e cheia de palha apodrecida. Foi quando se lembraram do jejuador, vasculharam a palha e o encontraram. Antes de morrer, o artista da fome confessou que jejuava porque nunca encontrou alimento que lhe agradasse. Desconfio que Bartleby confessaria que preferia copiar, atrás do biombo. O artista da fome foi enterrado junto com a palha apodrecida. O narrador-patrão de Bartleby considerou a hipótese de deixar o escrevente viver e morrer no escritório, sepultando, posteriormente, os restos mortais na parede (mas temia que o funcionário pudesse ser longevo e, quem sabe, reivindicar a posse do imóvel). A palha na jaula do artista da fome é o biombo no escritório de Bartleby, a diferença é que o jejuador quer aparecer, mas desaparece, enquanto o escrevente quer desaparecer, mas não consegue. A prisão do artista da fome está relacionada com o trabalho, no caso escrevente idem. Em ambos, o trabalho. Bartleby é um artista da fome que preferiu não. O artista da fome é um Bartleby preferiu sim. Os dois morreram por inanição.

As lições

Bartleby resiste, sem dúvida, mas como? Como pode! Simples assim! O biombo atrás do qual se refugiava era sua última linha de defesa. Seu sistema imunológico dependia do acordo firmado com o patrão. Se pudesse ao menos copiar e ser remunerado a quatro centavos por página de cem palavras, conforme havia combinado... Talvez morresse trabalhando, como o artista da fome, mas duraria mais tempo. Já não havia trabalho não pago suficiente num página com cem palavras remunerada a quatro centavos? Quanto valia efetivamente cada página copiada? Quanto o patrão-narrador ganhava por palavra? Era preciso exigir que revisasse documentos sem ser remunerado? Sim. Era. Bartleby é íntegro, o capital e suas personificações não são; o primeiro nunca aceitou nenhum tostão que não fosse fruto do seu trabalho, os outros insistem em não pagar pela mão-de-obra que utilizam, e não obedecem a nenhum acordo se tiverem força para burlá-lo. Esta é uma das lições do caso Bartleby. Não há acordo com o capital e suas personificações, “é querer ensinar um leão a comer alface” – diria um amigo.

Uma única vez Bartleby empregou o presente do indicativo (prefiro) de primeira, sem passar pelo futuro do pretérito (preferiria), foi quando o cozinheiro da cadeia (cara-da-boia) lhe ofereceu o jantar preparado após receber a propina paga pelo narrador. Depois morreu como o artista da fome. Mas não importa, a caridade do patrão era inaceitável. Bartleby não recusa absolutamente tudo, recusa a caridade moralista e seus complementos (como não pagar pelo trabalho que emprega), queria apenas ganhar pelas cópias que produzisse, conforme havia combinado. Mas o capital e suas personificações não cumprem acordos.

Outra lição do caso Bartleby. A resistência individual é inútil, não importa o quanto possa ser justa, radical e até poética. Fechado em si mesmo, atrás do biombo, o escrevente afastou a única possibilidade efetiva de resistência: a coletiva. “Eu preferiria não (I would prefer not to)” não se transformou em Nós preferiríamos não (We would prefer not to). São engraçados os exageros sobre Bartleby, atestam que os filósofos têm dificuldade para enxergar – e imaginar – algo além da recusa individual. A “fórmula” do escrevente “desarticula os atos de fala” [...], “destituindo o pai da sua palavra exemplar” (Deleuze). A “fórmula” do escrevente “abre uma zona de indiscernibilidade entre o sim e o não” (Agamben). Bartleby “solapa as coordenadas do sistema do qual se subtrai”, como se fosse a carta que, retirada, derruba o castelo de cartas (Žižek)17. Mas que prejuízo o escrevente causou ao patrão? O trabalho parou? Não. Houve greves ou paralizações? Não. Os trabalhadores reivindicaram aumento salarial ou melhores condições de trabalho? Não. O texto é literal demais para deixar dúvidas. Bartleby não incomodou porque a produção diminuiu (nenhum trabalhador seguiu seu exemplo, é mais provável que tenham se ocupado com as tarefas que ele se recusava a executar). Bartleby incomodou porque ficava parado de frente para a janela sem fazer absolutamente nada que não fosse dizer “Eu preferiria não”. Foram os bochichos e as fofocas que assustaram o patrão. Ao menor risco, o advogado mudou o endereço do escritório e deixou o escrevente para trás, como o capital muda de país quando suas exigências não são atendidas. A sentença de Bartleby (I would prefer not to) é mais eficiente para seduzir os filósofos do que para derrubar o capital. Os filósofos esqueceram o final do conto? Não lembram o que aconteceu com o escrevente? No romance A imortalidade, Milan Kundera18 parafraseia Rimbaud para criticar o tempo presente: “ser absolutamente moderno é ser aliado dos seus próprios coveiros.” Fazer louvação da recusa individual de Bartleby é se aliar aos coveiros do escrevente. Seria mais produtivo – e sincero – confessar que a história acabou e que qualquer tentativa de resistência coletiva é impossível19.

Quando ocorrem acidentes ou adoecimentos relacionados ao trabalho, o capital atua para transformar vítimas em culpados, como se estes tivessem deixado de cumprir regras ou orientações, é o que se chama de “teoria do ato inseguro”, que atua para absolver o processo de produção capitalista. Transformar a vítima (Bartleby) em herói, não resolve absolutamente nada, antes serve para, de outra forma, absolver o processo de produção capitalista, que não é questionado. Repetindo as perguntas. Por que Nippers tinha sua capacidade laboral comprometida pela manhã? Por que Turkey tinha sua capacidade laboral comprometida à tarde? Por que Bartleby teve sua capacidade laboral comprometida totalmente? Tais fenômenos estariam relacionados ao trabalho? Teriam relação uns com os outros?

Bartleby certamente diria que “Eu preferiria não”: nem culpado, nem herói. Num tempo em que o desemprego é oceânico e que as condições de sociabilidade são precárias, passa batido que o processo de produção capitalista causa adoecimentos e mortes, e não apenas exclusão e concentração de renda. É a principal lição do caso Bartleby. Por fim, lembremos o mote do movimento operário italiano dos anos 1960: "saúde não é mercadoria, não se negocia!"

Epílogo

Prefiro ver Bartleby como um poeta de um único verso. “Eu preferiria não” é forte como “Tinha uma pedra no meio do caminho”. O que restou do escrevente? Um verso. Prefiro ver Bartleby como um poeta que não cabia num escritório, como tantos que se refugiam atrás das pilastras e dos bimbos, ou dentro dos escaninhos e das gavetas. Prefiro ver Bartleby como um poeta liquidado por um modo de produção que exclui e elimina a poesia. Prefiro ver Bartleby como mais um trabalhador vitimado pelo trabalho. Desconfio que um funcionário de repartição tenha mais chances de entender Bartleby do que um filósofo consagrado. Dirão que minha leitura não é razoável, que vai de encontro à fortuna crítica do conto. Direi, com Bartleby, que, neste ponto, prefiro não ser minimamente razoável!


NOTAS

1 Deleuze, G. Bartleby, ou a fórmula. In: Deleuze, G. CRÍTICA E CLÍNICA. 2 ed. São Paulo: Editora 34, 2013. p. 91 - 117.

2 Agamben, G. BARTLEBY, ESCRITA DA POTENCIA. Editora Assírio & Alvim: Lisboa, 2007

3 Žižek, S. O ANO EM QUE SONHAMOS PERIGOSAMENTE. Boitempo: São Paulo, 2011.

4 Estrada, A. C. T. BARTLEBY O LA POLITICA DEL CAOS. Disponível em: http://www.redalyc.org/pdf/4138/413835218006.pdf  Acesso em: 23 de abr. 2019.

5 Vila-Matas, E. BARTLEBY E COMPANHIA. Trad. Maria Carolina de Araújo e Josely Vianna Baptista. Cosac Naify: São Paulo, 2004.

6 Melville, H. BARTLEBY, O ESCREVENTE. Trad. Bruno Gambarotto. Grua livros: São Paulo, 2014. A maioria das citações do conto é desta edição, quando forem de outras edições estará indicado.

7 Camus, A. CALIGULA. Disponível em: http://ekladata.com/VitBKW8efH33B054AZ9riu_QktA/Camus-Albert-Caligula.pdf Acesso em: 18 de abr. 2019.

8 Bento, A. I WOULD PREFER NOT TO - BARTLEBY, A FÓRMULA E A PALAVRA DE ORDEM. Disponível em: http://www.bocc.uff.br/pag/bento-antonio-bartleby.pdf  Acesso em: 18de abr. 2019

9 Esta é uma das poucas descrições de Bartleby, e as traduções variam. Exemplo. Bruno Gambarotto (Grua Livros): “Ainda posso ver-lhe as feições – sua fragilidade asseada, sua miséria apresentável, sua ruina insondável! Era Bartleby.” No original está registrado: “I can see that figure now – pallidly neat, pitiably respectable, incurably forlorn! It was Bartleby.” A tradução utilizada está em: Melville, H. BARTLEBY, O ESCRIVÃO: UMA HISTÓRIA DE WALL STREET E OUTRAS HISTÓRIAS. Trad. Cássia Zanon. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2009.

10 Blanc, A.; Bosco, J. DE FRENTE PRO CRIME. Disponível em: https://www.letras.com.br/joao-bosco/de-frente-pro-crime Acesso em: 20 de abr. 2019.

11 Marx, K. O CAPITAL - Livro I - Tomo II. São Paulo: Nova Cultural, 1986.

12 Neto, O. F. A exclusão do Bartleby de Melville e a “inclusão” do doente mental na sociedade. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_abstractHYPERLINK"http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php? Acesso em 24 de abr. 2019

13 Tradutores... Na edição que utilizei principalmente, no parágrafo que coloca o advogado-narrador sob suspeita, há um trecho sublime: "um saboroso acepipe moral para minha consciência". Acepipe moral? O tradutor certamente é poeta, só não sei se é fiel ao texto. Na outra edição está registrado "doce consolo para minha consciência". O original registra "sweet morsel for my conscience."

14 Borges, J. L. BARTLEBY, O ESCRIVÃO, DE HERMAN MELVILLE. Disponível em:  http://www.blogdaeditorarecord.com.br/2017/03/30/bartleby-o-escrivao-de-herman-melville/ Acesso em: 21 de abr. 2019.

15 A frase teria sido dita por Kafka a Max Brod: "Há muita esperança, só não para nós." Kafka, F. NAS GALERIAS. Trad. Flávio Kothe. Estação Liberdade: São Paulo.

16 Kafka, F. UM ARTISTA DA FOME & A CONSTRUÇÃO. Trad. Modesto Carone. Companhia das Letras: São Paulo, 1998.

17 Žižek, S. EM DEFESA DAS CAUSAS PERDIDAS. Boitempo: São Paulo, 2011.

18 Kundera, M. A IMORTALIDADE. Trad. Teresa Bulhões Carvalho da Fonseca e Anna Lucia Moojen de Andrada. Nova Fonteira: Rio de Janeiro, 1990.

19 Hardt e Negri tratam o caso Bartleby de forma mais razoável. Enxergam a recusa do escrevente como início de uma política libertadora, mas vazia se limitada a si mesma: "a recusa em si (do trabalho, da autoridade e da servidão voluntária) leva apenas a uma espécie de suicídio social." Hardt, M.; Negri, A. IMPÉRIO. Record: Rio de Janeiro, 2001.  

(Texto publicado originalmente no Passa Palavra)




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