A DERROTA DA CARETICE
A primeira lembrança que carrego da vida remete a 1982, lembro-me do quintal de casa, de rojões e depois lágrimas. Como é estranho ver lágrimas nos olhos daqueles que estão no mundo para nos proteger, neste dia meu pai chorou. O Brasil de Zico, Sócrates, Falcão e outros encantou e perdeu para a Itália de Paolo Rossi.
Não me recordo do jogo em si, mas aquelas lágrimas me marcaram muito. No futebol se ganha e se perde, é certo, e sempre há o recurso de culpar algo ou alguém, um juiz, um técnico, um goleiro... Então culpamos o futebol bem jogado, ofensivo. Daí os Lazaronis, Parreiras e Dungas que viriam depois.
Passados vinte e oito anos, e seis Copas do Mundo, outra derrota, mas sem encanto e magia, um Brasil melancólico perdeu para uma Holanda medíocre. Aqui surge uma primeira constatação: seleções retranqueiras e pragmáticas também perdem. Segunda constatação: seleções brasileiras de "bons moços" (muitos atletas de cristo) como a de 2010 são derrotadas também. Não nos esqueçamos disso.
Mas perdem sem arrancar lágrimas. Por quê? Talvez porque apenas nos faz chorar aquilo que nos emociona. Por isso derramamos lágrimas em 1982 e 1950, pela razão inversa não choramos em 2010. Outra constatação: exijo o direito de chorar em nome do futebol. Mas para isso precisamos dribrar, gingar, brincar, fintar... porque é assim que se joga nas praias, nos terrões e nas ruas do Brasil.
Por que a seleção brasileira não faz como fazemos nas praias, nos terrões e nas ruas? Sim, ganharemos e perderemos. Mas pergunto: quem pode jogar com a magia brasileira? Ninguém. Salvo talvez nossos irmãos argentinos, repito, talvez, em alguns poucos momentos. Então joguemos com magia, choremos na tristeza e na alegria, mas choremos. Mais encantamento!
Futebol retranqueiro e cartorial é triste, não é brasileiro. Nosso jogo é alegre, vistoso, atrevido. Talvez por isso a derrota para a Holanda tenha sido tão insossa, o povo não se reconheceu na seleção covarde, careta e sem ousadia. Jogamos com três volantes de contenção, dois atacantes medianos e um excelente meia (Kaká), mas que estava machucado e não foi decisivo como de costume. O ponto alto da seleção era sua defesa, isso não é Brasil.
Enfim, perder ou ganhar é parte do jogo, mas um povo que renega sua cultura e suas características é um povo suicida. Sendo assim, guardemos a seleção ciborgue e siliconada de Dunga nas páginas do esquecimento.

Um comentário:

Carpe Diem disse...

É incrivel o que é o futebol para o povo, é mais do que uma paixão, é quase como se nós estivessemos ali com a bola no pé. Porque digam o que quiserem, futebol é luta, é raça, é liberdade...Qualquer futebol que não mostre essas qualidades para mim não é futebol. Essa crônica explica bem, na minha opinião, o Brasil no momento daquele segundo gol da holanada contra o Brasil. Ai podemos ver um futebol que além de não ser futebol não é a imagem do povo.

Bjos