BREVIÁRIO DA INFÂMIA: A INFÂMIA EM SEIS ATOS

1º) Funcionário de empresa contratada pela Prefeitura de SP é filmado esguichando água num morador de rua. Trata-se de ação com a cara de pau higienista do Prefeito João Doria. A mesma da cara de pau de quem havia dito que tal prática não existia. A mesma cara de pau de quem havia dito que cumpriria o mandato até o fim.

2º) Em greve contra a reforma da previdência, que reduzirá salários e dificultará aposentadorias, professores de SP vão à chamada “casa do povo” para pressionar seus carrascos (parlamentares), são surrados e enxotados pela GCM de Doria e pela PM de Alckmin. As imagens de professoras e professores feridos giram o país.

3º) Juízes fazem greve para garantir recebimento do chamado auxílio-moradia, benefício escuso que possibilita ganhos acima do teto constitucional. Trata-se de ação imoral praticada pelos que aplicam leis criadas pela burguesia para manter a dominação burguesa e que, por isso, têm direito a benefícios escusos, como o tal auxílio-moradia, que é maior que o salário médio dos professores. A “luta” dos juízes pelo auxílio-moradia é um exemplo de que há coisas que podem ser legais e imorais ao mesmo tempo, como a escravidão nos primeiros séculos da história do Brasil.

4º) Com toda pinta de execução praticada por agentes do Estado, é assinada, no RJ, a vereadora Marielle Franco e o motorista que a conduzia, Anderson Gomes. A execução comove o mundo e divide o Brasil: há brasileiros que denunciam e protestam, há brasileiros que tentam justificar o assassinato.

5º) Assustados com a repercussão do assassinato da vereadora Marielle Franco, a turba de defensores do status quo parte para o segundo atentado contra a vereadora, inventam e propagam uma série de mentiras com a intenção de justificar o assassinato. Agem, na prática, como despachantes da barbárie. São cumplices do assassinato e da barbárie.

6º) Assustada com a repercussão do assassinato da vereadora Marielle Franco, a mídia empresarial tenta passar um pano para si própria, como se não tivesse passado anos defendendo discursos de ódio, sensacionalistas e de endurecimento da repressão. Como se o assassinato da vereadora não tivesse nada a ver com a intervenção militar em curso no RJ, intervenção que a mídia empresarial apoia e que a vereadora morta criticava.   

O título de um livro de Jorge Luis Borges ajuda a amarrar os fatos: História Universal da Infâmia. São seis atos para a história universal da infâmia. Infâmia de João Doria, infâmia da GCM de João Doria, infâmia da PM de Geraldo Alckmin, infâmia dos juízes e juízas em “luta” por auxílio-moradia, infâmia dos assassinos de Marielle e Anderson, infâmia dos que tentam justificar os assassinatos de Marielle e Anderson e, ressalte-se: infâmia da mídia empresarial: que apoia infâmias como a política privatista e higienista de João Doria, que apoia infâmias como a intervenção militar no RJ, que combate com infâmias a greve dos professores; mas que tira o corpo fora quando um funcionário joga água no morador de rua, que tira o corpo fora quando a polícia massacra professores, que tira o corpo fora quando assassinam a vereadora que combatia a intervenção militar. Nada mais infame do que a mídia empresarial tentando se afastar das responsabilidades por suas narrativas infames. Anos de promoção do medo, do ódio e da ignorância pelo discurso infame da mídia empresarial geraram uma geração de infames: eles estão no sofá da sala, assistindo a novela das nove; eles estão nas empresas multinacionais, tramando golpes de Estado; eles estão fardados, planejando chacinas; eles estão nos tribunais, “julgando”; eles estão parados no trânsito praguejando contra carroceiros e ciclistas; eles estão na internet comentando notícias que não leram; eles perderam a vergonha de ser infames. A infâmia enraizou-se, é preciso cortar as raízes da infâmia!