ANTIDICA: UM LIVRO PARA NÃO LER

Não ignoro que textos como este tendem a produzir o efeito inverso do que pretendem, mas vamos aos fatos mesmo assim. Existe um livro para não ser lido? Não. Certamente não existe. É a vida que é curta, o que coloca prioridades. E aqui surge uma questão: depois de perder horas lendo um romance menor, ainda me proponho a escrever algo a respeito, por quê?

Auto-análise não é o meu forte, mas imagino por que despejo tempo pelo ralo comentando um livro medíocre: vingança. Jogos Surrealistas ludibriou minha intuição. Meu método de flertar com o livro falhou feio. O gosto pelo novo e a disposição ao risco me fizeram dar uma topada na estante do sebo. Troquei Abadon, o exterminador, de Ernesto Sábato; por Jogos Surrealistas, do inglês Robert Irwin. Olhando agora, vejo que as indicações do logro estavam visíveis no meio da contracapa: três hiperbólicos elogios da mídia comercial. Motivo suficiente para desconfiar, mas ignorei o sinal vermelho e fui em frente.   

Paul Éluard, André Breton e Salvador Dalí participam dos jogos surrealistas de Irwin. Mas são figuras decorativas, panos de fundo que não dão pano pra manga. A Revolução Espanhola e a Segunda Guerra também não têm grande importância, exceto pelo fato de serem contemporâneas do amor do narrador da história, Caspar, que é um pintor surrealista inglês.

A orelha do livro anuncia uma investigação sobre sexo, surrealismo, imagística hipnótica, obras de cera, arte nazista, mesmerismo e loucura. Pura ilusão. O texto é totalmente kitsch. Amor brega orquestrado, com maestro e dupla sertaneja comercial. Pinceladas de bom gosto duvidoso, classe mediano e medíocre. Um romance siliclonado. Super-realismo de canção cafona repetida em caixa de música de boteco ao preço de moeda de meio real. Peruca que não cobre a careca.

Jogos surrealistas é a história do hiperamor tão comum ao tempo presente, espelho do vazio dos seres. Supra-realismo manco, dejetos de civilização e repressão varridos para dentro do inconsciente. Sentimento hipertrofiado em academia e com anabolizantes sintéticos. Amor mercadoria exposto em vitrine de shopping. Amor piegas, meloso, ridiculamente sentimental. Amor carência que dá azia no leitor.



4 comentários:

Dani disse...

Como um certo amigo escritor/oeta diz "Abaixo o amor enlatado!!"

JC disse...

O amor em conserva, com selo de procedência, data de validade e contrato de aceitação.

Joana Rocha Lima disse...

Camentando os comentários... Hahahaha... Sendo realista... Isso tá claro, que a grande maioria, boa parte, a maior parte das pessoas vivem em contrato de aceitação, se não vivem, estão à procura ou já viveram e estão dando um tempo. Na teoria (Abaixo o amor enlatado)é muito fácil, vamos ver na prática. Acredito que nada seja pra sempre, tudo que começa um dia acaba... :O Até quando a mesma história? Bláblá blá blá blá blá... Quanta hipocrísia.

Dani disse...

depende do que vc entende como “amor enlatado”. Esse amor que parece que não é amor, algo que faz-se necessário aquele “eu preciso ser amado”, alias o que é amor afinal? Realmente nada é para sempre, mas para que se importar se vai ser para sempre ou não, como diz Mario Quintana "O amor é a amizade que nunca acaba", mas e o amor possessivo, o “eu te amo” que em uma semana muda, ou pior o “eu te amo” por conveniência que acaba no "até que a morte os separe" e acaba no altar em frente ao padre com um juramento, a partir dai um pertence ao outro. Concordo com vc em um ponto Jojo, na prática é difícil, mas muito difícil pq o problema esta no social e não no individuo mas me nego a aceitar "o amor enlatado" que agente tanto ouve nas musicas comerciais e insiste em estar entre nós, prefiro antes o amor puro da amizade ou de um “Último Tango”.