RICARDO
"Como as grandes obras, os sentimentos profundos sempre
significam mais do que têm consciência de dizer."
(Albert
Camus)
Morre o rato, o gato, o
pato, o homem... Morrem bandidos, heróis, canalhas, velhos, crianças... Todos
morrem. E o rapaz morreu, pelas próprias mãos, talvez “como um cão”, como
Joseph K.
De um amigo poeta ouvi
que “o suicídio é a coragem para a burrice”. O senso-comum ensina que se matar
é um ato de covardia. À parte as reflexões ideológicas, é certo que, para o
suicida, o custo de viver é maior que o benefício. Para ele a vida é formada
por muitas desgraças e pouca ou nenhuma alegria. Pelo menos no tempo e espaço
do gesto definitivo. E “o tempo é ainda de fezes, maus poemas, alucinações e
espera”, como escreveu outro poeta, o mineiro Carlos Drummond de Andrade.
Nesse tempo, o
desaparecimento de uns é alegria para fofoqueiros e sensacionalistas. Falam em doenças
incuráveis, dívidas impagáveis, desgostos profundos, amores perdidos, chifres,
drogas, desilusões, falta de religião, educação ruim, fim dos tempos, pecados,
pais ausentes, amizades ruins etc., etc. Enfim, o fim de uns conforta outros,
que, apesar dos pesares, vão vivendo.
O trágico na vida humana
não é exatamente a morte, trágica é luta dos indivíduos impotentes contra o
destino inevitável: a morte. O que tortura é o envelhecimento diário, presságio
do desaparecimento final. Queda de cabelos, queda de dentes, perda de memória,
perda do tesão, rugas, dores, depressão, angustia, nostalgia.
Pior que isso é o
aniquilamento abrupto de alguns. Uma criança brincando, um caminhão
desgovernado... Um rapaz toma umas a mais, atravessa, não vê o carro vindo...
Rigorosamente falando, vida e morte são partes de um mesmo todo. Uma pedra não morre. Da mesma forma, é inconcebível a vida sem morte, já que vida, por definição, é o período que vai do nascimento até a morte.
Dessas linhas se conclui
que a vida é dura e a morte também. E as duas continuarão assim. Apesar daquele
rapaz, que se matou. Mas se matar é mais que isso. Ele não percebeu, os
fofoqueiros não fuxicaram a respeito. Se matar é, de certa forma, amputar um
pedaço do criador, que nada criou. Ou melhor, se matando o suicida aniquila a
idéia de criação, do sagrado e de paraíso. Já que, indiretamente ele afirma:
Foda-se a vida e todas as bostas desse e de outros mundos.
2 comentários:
Viver a vida sem esquecer da morte. Gostei muito do texto. Abraço.
Valeu John. Forte abraço, camarada.
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